O Supremo Tribunal Federal declarou a
inconstitucionalidade de dispositivos da Lei de Mobilidade Urbana (Lei 12.587/2012) que
permitiam a livre comercialização de autorizações de serviço de táxi e a sua
transferência aos sucessores legítimos do taxista, em caso de falecimento, pelo
tempo remanescente do prazo de outorga.
A decisão foi tomada na sessão
virtual encerrada no último dia 26, no julgamento da Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 5.337, ajuizada pela Procuradoria-Geral da
República (PGR). Para o ministro Luiz Fux, relator da ação, os dispositivos
transformaram em "mercadoria" as outorgas de serviço de táxi.
Regulação
Antes de analisar o mérito do pedido da PGR, o relator examinou os aspectos
jurídicos e as características dos serviços de táxi, que se enquadram na
categoria de transporte público individual. Segundo ele, uma das principais
inovações da Lei de Mobilidade Urbana foi a natureza de utilidade pública dada
ao serviço e sua sujeição ao poder de polícia administrativa. Embora não se
enquadrem na ideia de serviços públicos stricto sensu, mas entre as
"atividades da iniciativa privada", os serviços se submetem a uma
intensa regulação do poder público autorizante, por meio de um ordenamento
jurídico setorial.
Desvios indesejáveis
Fux rechaçou as justificativas apresentadas pelo legislador para a inclusão dos
dispositivos no texto normativo, que foram impedir o crescimento do mercado
informal de comercialização de outorgas e a suposta vulnerabilidade das
famílias dos taxistas quando do seu falecimento.
Para o relator, a transferência do
direito à exploração do serviço aos sucessores, mesmo que pelo tempo
remanescente do prazo da outorga, com anuência do poder público municipal e
atendimento dos requisitos fixados para o serviço, implica tratamento
preferencial, não extensível a outros setores econômicos e sociais. A regra,
segundo ele, impõe séria restrição à liberdade de profissão e à livre
iniciativa de terceiros, pois não há qualquer indicação e uma especial
vulnerabilidade a ser suprida pelo Estado comparativamente a outros segmentos
econômicos e sociais.
Segundo ele, ainda que tenha sido
motivada por nobres intenções, a norma gerou desvios indesejáveis, ao
transformar a outorga em bem patrimonial. Essa situação, a seu ver, não se
coaduna com a precariedade que usualmente caracteriza as autorizações.
Incentivos perversos
Quanto à livre comercialização das outorgas, o presidente do STF destacou que
ela permite aos detentores auferir proveitos desproporcionais na venda a
terceiros, contribuindo para a concentração de mercado e gerando
"incentivos perversos" para a obtenção das autorizações, não com
a finalidade de prestação de um serviço de qualidade, mas para a mera
especulação econômica. Ele afirmou, também, que o sobrepreço na comercialização
da outorga dificulta o acesso à exploração do serviço por interessados com
menor poder aquisitivo, o que contribui para que motoristas não autorizatários
sejam submetidos a condições mais precárias de trabalho, ao alugar veículos e
operar como auxiliares dos detentores das outorgas.
Princípios
Segundo Fux, não são toleradas, num Estado Democrático de Direito, escolhas
normativas e gerenciais que se afastem do artigo 37, caput, da Constituição,
segundo o qual a administração pública obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Para o ministro, mesmo
que a regra constitucional da licitação seja inaplicável, os critérios para o
acesso à outorga do serviço de táxi devem ser objetivos, impessoais e
isonômicos.
Por fim, o relator destacou que o
fato de a transferência estar condicionada à prévia anuência do poder público
municipal e ao atendimento dos requisitos fixados para a outorga e limitada ao
prazo remanescente não supre os vícios apontados. "Evidentemente, não
seria possível que o particular realizasse a cessão da outorga por prazo
superior àquele obtido para si. Tampouco poderia fazê-lo para pessoas que não
pudessem explorar a atividade econômica por recaírem em alguma vedação
legal", concluiu.
O voto do relator pela procedência da
ADI foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Ricardo
Lewandowski, Nunes Marques, Roberto Barroso e Rosa Weber. Foram invalidados os
parágrafos 1º, 2º e 3º do artigo 12-A da norma, com a redação dada pela Lei
12.865/2013.
Divergência
Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e
Marco Aurélio. Para essa corrente, a transferência do direito à exploração de
serviços de táxi, em vida ou com a morte do detentor da outorga, foi opção
encampada pelo Poder Legislativo dentro das margens do regramento
constitucional. Com informações da assessoria do STF.
Fonte: Conjur.
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