Para o autor da Ação Popular, que atua em Laranjal do Jari, os argumentos
do Governo do Estado (GEA) não se sustentam diante das provas documentais e
testemunhais.
O Professor Claudio Chaves, que é
servidor da rede estadual de ensino do Amapá, e mora e trabalha em Laranjal do
Jari (sul do Estado), representa um grupo de 12 (doze) professores que, há
quase dois anos, iniciou um movimento no Vale do Jari para reivindicar do Poder
Público condições adequadas para o ensino na rede pública durante a pandemia.
Em abril de 2021, o professor ingressou na Justiça do Amapá com uma Ação
Popular requerendo, entre outras providências em relação ao ensino remoto na
rede estadual, a imediata suspensão das aulas via whatsapp sem suporte
financeiro e tecnológico por parte do GEA.
Em 14 de dezembro passado, a juíza
Alaíde Maria de Paula, da 3ª Vara Cível de Fazenda Pública de Macapá, intimou a
parte autora a se manifestar sobre interesse de prosseguimento [ou
arquivamento] da Ação.
Naquela ocasião, cogitava-se uma
possível perda de objeto da ação, haja vista a pandemia parecer sob controle e
as aulas já terem sido retomadas na forma presencial para quase 100% do
alunado. Mas de lá para cá, as coisas mudaram muito: o Estado (e o País
inteiro) sofreu a 3ª e mais contagiante onda (ômicron) da covid-19, obrigando o
Governo a editar novos Decretos de suspensão de atividades presenciais,
inclusive atendimentos em órgãos públicos e atividades culturais como o
carnaval.
Além disso, por diversos fatores,
destacando-se as reformas em prédios escolares, várias escolas da rede
começaram o ano letivo 2022 inteiramente no modelo remoto e tendo como única ou
principal ferramenta para tanto o dito aplicativo de mensagens (whatsapp), o
que, no entendimento do autor da Ação e do advogado que o defende, enterra
qualquer possível argumentação da Procuradoria Geral do Estado (PGE) – que
defende o GEA – no sentido de sustentar que a Ação Popular teria perdido o seu objeto.
“Impossível sustentar tal
argumento”, rebate o professor Chaves. “A Ação não só não perdeu seu objeto
como, pelo contrário, em 2022, este se torna mais consistente, tendo em vista
que quanto mais tempo passamos com esse engodo (aulas pelo whatsapp) mais se
agrava a situação de todo mundo (alunos e professores) e mais demonstra o pouco
interesse do Governo em resolver a situação, afinal, estamos falando de 3 anos
consecutivos sem aulas presenciais de modo contínuo e geral, não de 3 semanas
ou três meses”, conclui.
Numa sinalização de que vai emitir
sentença sobre o mérito da Ação Popular, a Magistrada publicou no último 07/03
ordem de intimação das partes (autor e réu) para que “digam [as partes] se ainda têm
algo a requerer em 15 dias”.
O advogado que representa o
professor Chaves, Clóvis Silva, disse que ainda não foi oficialmente intimado,
e quando o for, requererá exatamente a manifestação da Juíza sobre o mérito da
Ação impetrada. “Já fizemos tudo que nos cabia no processo e apensamos todas as
provas. Assim que formos notificados, nossa manifestação será pelo deferimento
do requerido na peça, ou seja: a imediata suspensão das aulas via whatsapp, não
só pela sua ineficácia enquanto estratégia pedagógica e os impactos financeiros
e sobre a saúde tanto de professores quanto de alunos, mas também pela questão
da [in]segurança digital, uma vez que vivemos um momento em que até a mais alta
Corte de Justiça do País (STF) se vê às voltas com a utilização desse tipo de
ferramenta (aplicativos de mensagens) na sociedade e seus impactos em todos os
assuntos, desde a dependência de usuários a crimes eleitorais, entre tantos outros”,
esclarece Clóvis.
HISTÓRICO
No dia 20 de agosto de 2020, o
professor Claudio Chaves e mais 11 colegas lançaram um Manifesto Público de
cinco páginas, onde conclamavam as autoridades públicas, órgãos colegiados e a
sociedade civil em geral para abrirem um debate democrático amplo e plural em
torno das questões relacionadas à oferta de ensino remoto tanto na rede
estadual quanto nas municipais da região (Laranjal e Vitória do Jari-AP e
Almeirim-PA, este último representado pelo Distrito de Monte Dourado).
No documento, os professores
descreveram as dificuldades enfrentadas por docentes e discentes com as aulas
pelo whatsapp; chamavam a atenção para os impactos imediatos, a médio e longo
prazos, sendo os mais consequentes o adoecimento tanto de professores quanto de
alunos, o aumento descontrolado da evasão e da desistência escolar e a
ampliação do abismo entre alunos da rede pública e da particular, especialmente
os concluintes do ensino médio, que ficariam praticamente sem chances de entrar
no ensino superior através do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), principal
mecanismo de acesso dos alunos da escola pública às universidades.
Naquele ano (2020), os professores
ainda recorreram a Câmara de Vereadores de Laranjal do Jari para que esta convocasse
uma Audiência Pública para discutir o assunto; mas o pedido foi ignorado.
Não encontrando eco ao seu clamor,
os professores apelaram para a “última fronteira” (a Justiça) e, em 12 de abril
de 2021, o professor Claudio Chaves protocolo a Ação Popular da qual aguarda
para dentro em breve o desfecho final.
Chaves faz uma antecipação e um
apelo: “Não consigo vislumbrar outra decisão da Justiça senão pelo acolhimento
de nossa petição (a suspensão imediata das aulas remotas pelo whatsapp e a
providência de tecnologias adequadas). Não há nada que justifica a continuação
dessa vergonhosa tragédia. Mas se, por ventura, a decisão for contrária (o que
não está descartado – e temos consciência disso), certamente recorreremos, pois
estamos apenas na primeira instância recursal. Ademais, com ou sem pandemia,
jamais deixaremos, daqui pra frente, de utilizar o modelo remoto de ensino.
Queremos, portanto, evitar que esse ‘provisório’ não se tornará definitivo, ou
seja, que as aulas pelo whatsapp se tornem uma regra no ensino público do Amapá
mesmo depois que a pandemia for superada, como aconteceu, por exemplo, com os
sábados letivos. E o apelo que fazemos é para que a sociedade, principalmente
os alunos e sues responsáveis se mobilize, exerçam (alunos e pais) a sua cidadania,
pressionem as autoridades, se organizem... afinal, os maiores prejudicados
nesse processo estão sendo seus filhos; e essa dívida praticamente não terá
como ser paga; é um prejuízo irreversível”, alerta.
Vale destacar que caso a sentença
seja favorável à demanda dos professores – e, havendo recurso, seja confirmada
por instâncias superiores –, poderá criar uma jurisprudência para outros
estados e, enfim, para o País.
Da Redação do Tribuna do Vale