De acordo com o site The Intercept Brasil, cerca de 90
enfermeiros de Macapá receberam uma ordem da prefeitura: cada um teria que
entregar kits com vitaminas, zinco e ivermectina em ao menos 15 casas, ou a 60
pessoas. Além dos enfermeiros, técnicos de enfermagem e agentes comunitários de
saúde também foram convocados a distribuir massivamente o “kit covid”, que a
prefeitura acreditava prevenir contra a covid-19. Participar deste mutirão não
era uma escolha – quem se recusou, está desempregado ou teve que entrar na
justiça para reverter a demissão.
À jornalista Nayara Felizardo, as denunciantes pediram para
não ser identificadas com medo de sofrer represálias. A repórter conversou com duas
enfermeiras que discordavam da entrega do kit covid e também foram demitidas. “O
diretor da UBS e a secretária de saúde me obrigaram a ir distribuir os kits com
minha equipe. Eu achei isso totalmente irregular e fiz comentários na sala onde
tinham pessoas próximas a eles. Fui entregar os kits por medo de perder o
emprego, mas não adiantou nada”, contou uma das profissionais. A outra
enfermeira, que também me disse ter sido demitida após criticar a distribuição
dos kits, conseguiu o emprego de volta por decisão judicial. “Não justificaram
nada para fazer meu desligamento, então recorri à justiça”.
O kit é comprovadamente ineficaz contra o coronavírus, como atestou a Organização Mundial de Saúde, a OMS, ao orientar que o medicamento não fosse utilizado no tratamento em pacientes com a covid-19. A Sociedade Brasileira de Infectologia também foi firme ao dizer que “tais medicamentos têm sua ineficácia comprovada”.
Os profissionais faziam parte das equipes do programa nacional de Estratégia de Saúde da Família, que recebe recursos do Ministério da Saúde, mas é gerido pelas prefeituras. Em 3 de março, a coordenadora do programa, Cristilene Vilhena, enviou mensagem para o grupo de WhatsApp Saúde Rural, em que estão os profissionais de saúde que atendem aos maiores distritos da capital, dizendo que todas as equipes estavam sendo convocadas para uma força tarefa para distribuir os kits.
Mensagem
enviada pela coordenação do PNESF convocando os profissionais de saúde para um mutirão de distribuição do kit de
tratamento precoce.
O prefeito Antonio Furlan, do Cidadania, gravou um vídeo para o Instagram da prefeitura, anunciando a distribuição dos medicamentos “através das equipes de Estratégia da Saúde da Família”. Médico cardiologista, ele não viu problema em defender que o kit seria uma forma de “reforçar a imunidade da população”. Mas a distribuição não parou em março. Os kits foram distribuídos pelo menos até agosto, segundo mensagens de WhatsApp encaminhadas pela prefeitura aos profissionais as quais tive acesso.
A hepatite medicamentosa é um dos riscos do uso
indiscriminado de ivermectina. A medicação tampouco tem qualquer efeito contra
a covid-19. A maioria das pessoas considera que o medicamento não faz nenhum mal.
O ato da Prefeitura é também desperdício de dinheiro público.
Ao todo, foram distribuídos 150 mil kits em Macapá, que custaram cerca de R$ 3
milhões aos cofres do município, como revelou o UOL em março.
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